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Fatores que contribuem para o aumento do índice de suicídio entre jovens do segundo grau

Publicado em 28/09/2021

Esta é uma realidade crescente no Brasil e que os dados estatísticos não conseguem acompanhar em tempo real, pois o tema suicídio ainda é visto como tabu e muitos setores da mídia entendem que, se falarem muito deste tema, podem incentivar o aumento de casos. A meu ver é um erro grotesco imaginar que trazer números atualizados sobre o suicídio juvenil no Brasil pode aumentar o número de casos. Ao contrário, sou defensor da ideia de que deve ser falado sobre o tema e suas causas, para alertar e levar as famílias e escolas a saírem da zona de conforto e distanciamento que estão construindo entre os jovens.

Infelizmente caímos naquela máxima de cada mês se priorizar uma temática específica de campanha pública no Brasil, assim, o setembro amarelo muitas vezes fica só no setembro, e com uma repetição de conceitos que aos poucos acaba banalizada. Mas vida e morte são diárias, principalmente no tema suicídio, que é uma demanda de saúde mental e que faz parte do existir cotidiano de cada pessoa e da sociedade.

Suicídio juvenil nas escolas

Aqui, quero focar na crescente demanda de casos que escolas relatam nos bastidores das comunidades educacionais: Jovens que vieram a óbito por causa de uma ação suicida. Conversando com uma professora de uma escola técnica estadual do estado de São Paulo, só na escola dela, que é eminentemente de segundo grau, de 2018 a 2021 (agosto), foram seis casos de suicídio. Um deles foi negado pela família e os outros cinco não foram registrados como suicídio. Se formos de fato ouvir cada escola de segundo grau no Brasil teremos um número assustador de casos. Esta professora relatava com muita tristeza e revelava que o sentimento coletivo daquela comunidade escolar a cada episódio de suicídio causava um transtorno generalizado entre todos. Pior ainda, é que em todos os casos os professores já identificavam algum comportamento diferenciado do jovem em sala de aula e depois também nas aulas on-line, em plena pandemia. Mas, ao tentarem acionar as famílias para algum alerta, elas não se preocupavam muito. Poucas são as escolas de segundo grau que têm o setor de Psicologia Educacional para poder dar suporte de escuta e encaminhamentos para situações adversas nas condutas dos alunos. O que ajudaria e muito no processo preventivo no cotidiano das escolas.

Aqui, quero pontuar alguns fatores que estão sendo estimuladores para o sentimento suicida entre jovens de segundo grau no Brasil, que vou pontuar a partir de minha escuta clínica de jovens e professores e também por estudos de diversos artigos e reportagens na grande mídia, mas que não tem uma conotação estatística sistematizada:


Fator 1: Depressão

A depressão é o carro chefe em 80% dos casos que desembocam no suicídio. Geralmente um transtorno emocional que não é muito percebido pelos familiares, pois há na família brasileira a ideia de que a depressão é coisa de adultos e um estereótipo de sujeito acamado, com cara de sofrido. Mas entre os jovens a depressão vem camuflada em hábitos, como: ficar trancado no quarto navegando na internet por muitas horas; isolamento social; relacionamento com grupos de jovens que se encontram para usar álcool intensamente e/ou com um estilo de vestir “uniformizados”, com uma conotação de contraste com a realidade de ser do jovem no cotidiano; baixo índice de diálogo dentro de casa e baixo estímulo para estudar. Muitas vezes, estes comportamentos são vistos como jeito jovem de ser e faz os pais acharem que é normal. Além de que, há uma postura dos jovens em negar os comandos dos pais, refutando com ataques, e desta forma os pais acabam ficando com receio de chegarem junto aos jovens. Há aí um distanciamento que impede a família de ver o sofrimento depressivo do jovem. Uma geração refutando a outra dentro de um mesmo ambiente. Há o desencontro dos olhares, que é um excelente mecanismo para se identificar no outro o desenvolvimento da depressão.



Fator 2: O dilema das redes 

Esta é a geração que pegou o maior avanço da Tecnologia de Informação (TI). Hoje, os jovens têm um celular às mãos com o potencial de fazer muita coisa e conectam-se com o mundo de forma rápida e instantânea. A linguagem tecnológica que os jovens do ensino médio estão manuseando está numa velocidade superior à linguagem que as escolas estão oferecendo, tanto que em plena pandemia da Covid-19 poucos alunos suportavam assistir as aulas on-line. O recurso tecnológico das TIs chegou para ficar e avançar mais ainda. Mas aqui observamos que, pelas facilidades e por conectar os jovens nas diferentes redes de comunicação, gerou-se também uma dependência nesta linguagem. Um apego exacerbado na TI e um distanciamento no ato de desenvolver atividades. Entre o tempo de se estar nas redes, nos jogos e nos produtos prontos, o dia a dia da maioria dos jovens é estar sentado à frente de um eletrônico passivo e sem desenvolvimento de habilidades e talentos. Alguns jovens pensam que se utilizarem o gosto e apego pela TI podem se tornar profissionais de TI e poderão ganhar muito dinheiro. Mas quando tentam, não conseguem, pois ser um profissional nesta área requer domínio de códigos e precisa ter o perfil para tal. Assim, este mergulho nas redes digitais tem revelado mais perdas do que ganhos aos jovens de segundo grau. Uma das perdas recorrentes é na imaturidade, sendo que há situações em que se perdem até cinco anos de maturidade, levando o jovem muitas vezes a não conseguir lidar com pressões e situações adversas pela falta de maturidade, assim, o recurso é a autoagressão ou o suicídio. Outro fator derivado desta dependência é o isolamento social e a perda de atitude para agir, desenvolvendo sentimento de menos valia de falta de estímulo e, consequentemente, à depressão, um passo para o suicídio.



Fator 3: Sociedade homofóbica e negacionista 

Na atualidade, há uma forte tendência dos jovens terem mais abertura para assumirem posições na ordem sexual que os colocam com mais coragem de assumirem a bissexualidade ou a homossexualidade. Mas, muitos não conseguem manifestar esta escolha aos pais ou familiares por preconceito ou questões religiosas. Diante de uma condição de gênero que não condiz com a tradição familiar pautada na heterossexualidade, associada ao não diálogo e condutas repressoras, muitos jovens acabam se fechando e tendem ao desejo suicida para não ter que encarar este desafio. Fator que se agrava com a imaturidade decorrente do apego às tecnologias de informação, citado no item 2. Também temos jovens que avançaram em conhecimentos às vezes até mais do que os próprios professores e que se deparam com familiares com baixa informação e com posturas religiosas arcaicas que negam os avanços tecnológicos e/ou partem para posicionamentos negacionistas. Este conflito de geração contribui fortemente para o distanciamento e para a falta de diálogo no núcleo familiar. Até acontecem também ataques de muitos professores que tendem a não acolher a demanda dos alunos, mas simplesmente atacam, levando o jovem ainda mais ao distanciamento e a sensação de que está sem apoio.


Fator 4: Falta de perspectiva 

O cenário sócio, político e econômico do Brasil atual é muito ruim e sem muitas perspectivas em médio prazo. Com a pandemia vimos o quanto os jovens perderam conteúdos e contatos e os que ficaram mais defasados foram os das classes C, D e E, fator que está gerando um abismo entre os mais favorecidos das classes B e A. Mesmo entre jovens que terminaram o ensino médio de formação técnica e/ou os que terminaram uma faculdade, não há emprego. Com o desgoverno na educação levando a fragilização estrutural das universidades públicas, os jovens viram seus sonhos na perspectiva educacional desabarem. Este fator agrava, e muito, o comportamento dos jovens sobre as atitudes para com os estudos e a baixa estima fica lá nas nuvens. Assim, novamente abre-se uma porta escancarada para a depressão e, consequentemente, para a fuga desta realidade. Até para animarem-se a sair às ruas e reivindicar mudanças na política do país, os jovens acabam perdendo a coragem, principalmente por não se ter clareza hoje de referenciais políticos a serem seguidos.

Se for continuar a enumerar os múltiplos fatores que podem estar contribuindo para o aumento do suicídio no meio dos jovens do segundo grau, teríamos que colocar muitos outros itens. Mas prefiro ficar com estes citados, para pelo menos despertar a necessidade das escolas e famílias a se atentarem a esta realidade e começarmos, juntos, a agir na prevenção, que passa necessariamente no falar sobre, debater e buscar caminhos. A omissão não vai contribuir em nada para vermos mudança neste cenário.


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