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Quando o tempo de natal faz adoecer emocionalmente

Publicado em 19/12/2016

Era dia de Natal, ainda criança, estava junto com minha família ao redor da mesa na hora do almoço. A campainha toca e alguém desesperadamente começa a falar chamando por uma senhora que estava conosco, em casa. Seu irmão tinha acabado de cometer suicídio. Foi aquele desespero. Nesta cena, só lembro de meu sentimento de indignação  e questionamento: “Mas por que foi fazer isso bem no dia de Natal?”

Depois, com os estudos e longo tempo de atendimento analítico, comecei a dar respostas para esta pergunta de infância. O Natal por si só é frustrante dentro desta perspectiva de consumo, onde os presentes tomam conta do imaginário coletivo e as comidas e bebidas também. Sempre fiquei muito reticente com a quantidade de comida que se faz no natal, principalmente quando comecei a ter noção do desperdício e também quando comecei a fazer avaliação sócio crítica com a vida e seus episódios. Enquanto milhões passam fome os lixos do dia posterior ao Natal ficam cheios de comida. O papai Noel que só chega para as crianças cujos pais tiveram dinheiro para comprar um presente, num cenário em que milhões de crianças ficam sem presentes. E nas ações de solidariedade, destas que ajudam no desencargo de consciência dos mais abastados, os brinquedos são tão ruins que não resiste a uma semana. 

Mas o pior do Natal fica por conta do processo regressivo que automaticamente esta data desencadeia. As pessoas se deslocam muitas vezes de cidades distantes para o encontro com os familiares que não puderam encontrar durante todo o ano. Tanto, que as rodoviárias do Brasil ficam super lotadas. No primeiro momento a alegria e festa do encontro com aqueles que amamos. Mas depois vêm as trocas de informações, as conquistas, as fofocas e até chegar às lembranças de família. Se não estiver atento, toda esta mobilidade do encontro  transporta para o ontem, nascendo com esta regressão a angústia, sentimento que está associado à questões não resolvidas de vivências do passado, por que foram muito agradáveis e não voltam mais, ou por que foram extremamente frustrantes. Neste sentimento que brota, o Natal começa a perder a sua cor, seu brilho.

Quando vamos ao encontro dos familiares, principalmente na cidade onde nascemos ou que fomos criados a maior parte de nossa infância, acontecerá o processo emocional de regressão natural. A pessoa passou o ano todo sem ver os familiares e  mesmo cria aquela expectativa de encontrar as coisas como estavam. Se as cenas de infância foram favoráveis, o desejo de se encontrar com este passado que remete boas memórias. Mas se as cenas gravadas do passado foram as piores possível, a regressão vem com força em aspectos negativos  com a expectativa de que as pessoas mudaram para melhor. Costumo dizer que a fantasia do encontro saudável dura por vinte e quatro horas, depois, no decorrer da convivência, observa-se que as pessoas que ficaram continuam as mesmas. Mesmo nas famílias que ninguém saiu de perto um do outro, o Natal reserva estas lembranças e expectativas. Entra ano e sai ano tudo acontece do mesmo jeito. Natal em uma família e ano novo em outra. As mesmas comidas, os mesmos rituais,  a regressão vem forte mesmo assim. Pior ainda, que a alegria dura até na hora da troca de presentes.

Mas por que o Natal é uma data que nos remete à regressão? Pelo motivo de ao longo de nossa infância, por volta de doze anos de nossas vidas, passamos ano após ano cultivando a espera do Natal, do papai Noel, dos presentes, dos doces e das comidas gostosas. Quando criança não conseguia identificar os conflitos familiares, as disfunções afetivas, tudo tinha seu  colorido e estava na ordem da fantasia. Mas ao crescermos, ficamos com esta fantasia natalina de criança dentro de nós. É aquela criança eterna em nosso pensamento. Por isso que devemos lembrar que no Natal, somos pessoas crescidas, e não precisamos mais do carinho e afeto dos familiares para sobreviver. Encontrar-se com os familiares sabendo de quem eles são e não desejando que eles estejam do jeito que gostaríamos que estivessem. O pai que a vida toda foi fechado e sem manifestação de afeto, continuará sendo o mesmo homem. A mãe ansiosa que ao invés de dar atenção aos filhos estava preocupada com os preparativos de comida vai continuar agindo da mesma forma. Pior ainda, todos aqueles que eram adultos no nosso natal de criança, tendem a estar com suas neuroses mais acentuadas. O fechado e grosseiro mais fechado do que antes. O ansioso, já estará uma pilha de nervos. 

Para não cair nas tramas de uma regressão patológica ao encontrar-se com seus familiares neste Natal, encontre-se consigo mesmo na sua identidade. Respeite o outro como ele sempre foi ou está. Saiba que ao crescer, o adulto precisa abandonar a posição do querer receber para o querer ofertar. Amar ao outro de sua família na condição dele. O passado não será recompensado, não será revitalizado. Utilize as cenas favoráveis e desfavoráveis de sua infância, como elemento de auto conhecimento. Quem sabe assim, tendo mais identidade a partir de si mesmo, o natal fique mais agradável, pois vai prevalecer o encontro com aqueles que amamos.

Se seu Natal tem o significado de trocas mercantilistas, onde ao dar espera receber, boa regressão emocional e consequente sofrimento, cuidado. Mas se ao contrário, seu Natal tem o significado do amor, da fraternidade e solidariedade, suas regressões emocionais te ajudaram para agradecer a sua história construída no seio de sua família. Ai sim, seus encontros serão de profundo agradecimento pelo que cada outro de sua família foi para você.


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