Psicologia do desenvolvimento infantil – O partoPublicado em 27/02/2020 Neste texto, uma sequência da série acerca do desenvolvimento infantil, quero dar ênfase ao parto. Para esta reflexão, vou extrair o pensamento de Ashley Montagu, antropólogo que também fez parte do círculo psicanalítico mundial e foi membro da Universidade de Harvard e Princeton nos Estados Unidos. A partir de estudos de observação de gestantes, tanto no ambiente familiar e social, como também por pesquisas de observação laboratoriais, Montagu se debruça longamente no processo de trabalho de parto quando do nascimento de uma criança, medindo a importância deste processo na vida emocional e no futuro emocional deste novo rebento. O parto, como gesto de acolhida do bebê O início do trabalho de parto é um sinal antecipado para a mãe de que a criança está desejando sair do útero, o qual, por nove meses, foi sua primeira casa, um mundo protegido e, se planejado e desejado, com certeza muito gratificante. Lógico que não é a criança no estágio intrauterino que está desejando sair é a fisiologia já no estágio amadurecido que inicia os sinais. Aqui, Montagu nos confirma que o trabalho de parto é a primeira massagem que o ser humano recebe, pois as contrações musculares de cima para baixo são estímulos musculares ao feto e propiciam quase que um carinho na criança, incentivando ela a passar de um mundo para o outro. Este mundo é quase desconhecido, mas, pelas percepções sonoras e de estimulação afetiva ao entorno da gravidez, com certeza já foi projetado na criança uma boa entrada nesta nova etapa do pós-parto. Deixar acontecer o trabalho de parto é permitir esta primeira massagem afetiva. Mesmo que a evolução do trabalho de parto não chegue às vias do parto normal, e sim de uma cirurgia de cesárea, só a fixação da massagem uterina que a criança recebe já é um fator fixador positivo para as etapas do desenvolvimento psicológico. Esta massagem gestacional representa uma mensagem biológica ao feto: “Vem, seja bem vinda a sua nova casa.” É como se fosse uma acolhida. Neste sentido, incentivo muito as mulheres gestantes a deixarem se permitir pelo menos o trabalho de parto. Acentuo este aspecto aqui por que no Brasil o processo de incentivo ao trabalho de parto é muito desestimulado por conta da ideia de que a cesariana é o melhor meio de se garantir o nascimento de uma criança, e que o parto normal é algo que exige muito das mulheres e está muito associado com dores e sofrimento. Esta é uma ideia arcaica muito divulgada pela indústria do parto, que afere mais lucros à medicina, sendo que o incentivo ao parto natural, ao contrário, envolve menos profissionais e o pós-parto resulta em um consumo medicamentoso absurdamente menor que o processo pós cesariana. Sabemos que uma cesariana requer um médico e outro médico anestesista, e um parto normal bem desenvolvido requer uma enfermeira obstetra bem treinada. Esta é uma verdade científica que no Brasil pôde ser testada pelo programa QUALITIS, sob a assessoria do renomado médico Davi Capristano, que na cidade de São Paulo conseguiu por dois anos consecutivos desenvolver monitoramento de partos normais com mulheres de periferias no programa continuado de acompanhamento neonatal, onde obtiveram 100% de parto normal, sem a necessidade se quer de um médico obstetra, apenas de enfermeiras obstetras. Esta é uma realidade que não avançou no Brasil, por outro lado, em países desenvolvidos os processos de parto normal são em uma proporção de quase 80% em relação às cesarianas. Isto para mostrar o quanto que o término de uma gestação carrega em si uma forte estimulação propulsora para a nova vida da criança. O que parece um sofrimento, na verdade é um artifício estimulador de afeto ao corpo e psique de uma criança. Se a ideia do trabalho de parto foi veiculada como algo sofrível e aterrorizador no imaginário das mulheres do Brasil, é por que a indústria farmacêutica e o loby médico assim planejaram a publicidade de um trabalho de parto. Hoje parece que vale mais a pena agendar o dia em que a criança deve nascer. Mas este dia tem as condições naturais fisiológicas que serão manifestadas no dia e na hora certa, que não é definido alheio ao processo natural da mulher. Vivenciar o trabalho de parto e assim colaborar para saúde psíquica do bebê Dentro deste cenário de medos em torno de um parto e de evitar o sofrimento favorável ao nascimento, vemos já emergir o ambiente de ansiedade, de sofrimento depressivo e de expectativas negativas em torno do futuro da criança que vem ao mundo. Mães que aprendem a importância de vivenciarem um trabalho de parto, e que aprendem a importância de um parto natural, ou normal, estão colaborando para que a entrada do novo ser ao mundo, ou a sua casa nova, seja brindada de alegria, naturalidade. Enfrentar dores e sofrimentos tão naturais na existência humana já é o registro de uma etapa superada. A ideia do “tomou doril a dor sumiu”, é uma ideia consumista de felicidade. Uma felicidade pautada pelas amarras dos laboratórios. As mães que passaram por partos naturais, têm uma percepção muito favorável desta etapa, e inclusive se recuperam mais rapidamente em relação as que fizeram cesariana. Lógico que a cesariana é um recurso evoluído da medicina para casos que tenha reais necessidades, que em países desenvolvidos é uma pequena porcentagem. De tudo que demonstrei neste texto, vale frisar na importância da mãe garantir o trabalho de parto, para dar gratuitamente a primeira massagem afetiva para este rebento que dá sinais de seu desejo de vir ao mundo. |
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