O poder de criarmos transtornos emocionaisPublicado em 27/02/2025 Os transtornos emocionais são sintomas que a mente desenvolve ao longo dos anos e que, há muito tempo, foram sistematizados por um código internacional de doenças que compreende mais de 350 itens e diversas variações. Hoje, todos que passam por uma consulta psiquiátrica correm o risco de serem detectados com algum transtorno emocional. Ao acessar a internet, podemos ler e entender sobre estes transtornos e, quem sabe, até nos autodiagnosticar. Existem transtornos para tudo, mas os mais relatados e comuns, que de fato ocorrem na clínica psicológica e que são mais frequentes na maioria dos consultórios psiquiátricos, incluem: Transtorno de Pânico, Ansiedade, Depressão, TOC (Transtorno Obsessivo-Compulsivo) e transtornos alimentares, como Bulimia e Anorexia.
Ao desconsiderarmos as possíveis causas diagnósticas que podem integrar um sintoma - como fatores relacionados a um quadro de saúde física, perdas parentais (luto), acidentes, fatores genéticos e cognitivos - percebemos que, na maior parte dos diagnósticos, não conseguimos identificar uma causa específica. Desta forma, observo, na minha clínica psicológica e dentro do referencial da escuta psicanalítica, que os transtornos emocionais são sintomas que refletimos ou que refletem elementos inconscientes que emergem para nos alertar. Prefiro entender que, ao longo da nossa história de vínculos afetivos com outros, na família e na sociedade, desenvolvemos sintomas, que, eventualmente, emergem como um vulcão em erupção.
Mas, de fato, criamos esses transtornos? Acredito que sim. Muitas vezes, para permanecermos na mesma posição onde precisamos nos fixar. Em outras, para tirar vantagem nas relações com os outros. Ou porque fomos educados sob um forte apelo repressor, onde as emoções e os pensamentos não puderam se manifestar. No entanto, em algum momento, essas emoções se manifestam em forma de sintomas, causando uma série de problemas, visto que cada sintoma, sendo codificado entre as diferentes categorias emocionais, envolve, sim, sofrimento. A clínica psicológica, com referencial teórico e técnico da psicanálise, vê nos sintomas a emergência do inconsciente, isto é, aquilo ao qual até então não tínhamos acesso ou resistimos em sentir.
Assim, a psicoterapia e/ou análise são formas de ajuda profissional ao paciente para que este possa se encontrar com as fantasias desenvolvidas na forma de sintomas emocionais. O processo leva o paciente, primeiramente, a escutar os sintomas, vê-los, senti-los e mapeá-los. Depois, é conduzido a pensar no porquê, ao longo da sua história, foi preciso criar um sintoma emocional e como saber conversar com sua própria fantasia. No entanto, isso leva tempo, pois, no primeiro momento, o paciente reluta em entender ou aceitar que se trata de uma fantasia construída ao longo dos anos. Essa resistência é agravada quando o paciente já tem um diagnóstico definido e uma orientação médica de que precisará de medicação para sempre, e que a medicação dificilmente sairá do paciente.
Esse é um ponto que frequentemente gera conflito entre a visão da psiquiatria, encravada no código internacional das doenças emocionais - com apoio de laboratórios que sustentam essas pesquisas de resultados dos transtornos - e a psicanálise, que acredita na possibilidade de ouvir os sintomas, elaborá-los e assim reposicionar-se, levando à melhora do quadro. Lidar com os sintomas emocionais é possível
Sempre digo aos meus pacientes que eles são tão criativos que conseguem até criar sintomas emocionais, acreditar na própria criação e fazer com que muitos ao seu redor também acreditem. Contudo, essa minha posição pode nos levar a uma tentativa de banalizar os transtornos emocionais. É importante lembrar que um transtorno emocional precisa ser tratado com respeito, sendo necessária uma avaliação psiquiátrica e o uso de medicação em muitos casos. Em alguns quadros, o transtorno emocional se torna uma característica permanente do indivíduo, o que pode exigir medicação contínua. Em casos de transtornos psicóticos, por exemplo, uma boa condução medicamentosa e psicoterapêutica pode permitir que o paciente leve uma vida normal, mesmo com o transtorno definitivo. Eu atendo pacientes esquizofrênicos que aprenderam a lidar com o transtorno e convivem bem em sociedade.
No entanto, no cotidiano e no processo de interação, todos nós temos resquícios de transtornos emocionais. Mesmo quando associado a medicamentos, o tratamento pode levar à alta medicamentosa. Esse processo ajuda o paciente a não negar os sintomas, mas a se encontrar com eles, entender o motivo pelo qual os criou e desfazer a fantasia que os originou. Lembre-se de que, na maioria dos casos, o tratamento não é a eliminação dos sintomas, mas sim a capacidade de dialogar com eles. Se o sintoma criado for monstruoso para o paciente e o levar a temer vê-lo, o tratamento pode permitir que ele enfrente seu próprio monstro. |
|||
| |||
|
Visualizações: 75